quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

15 razões da vitória chavista na Venezuela

Foto: Reuters
Do site Opera Mundi:

O chavismo alcançou uma contundente vitória eleitoral em 10 de dezembro, superando todas as organizações políticas que disputaram contra o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) e outros partidos da coalizão Grande Polo Patriótico (GPP).

Em uma primeira análise, a vitória em mais de 300 municípios se deve a um conjunto de fatores:

1. Sequência triunfal do chavismo: desde o fim de julho deste ano, até 10 de dezembro, um lapso de 140 dias, se efetuaram três processos eleitorais na Venezuela: as eleições para a Assembleia Nacional Constituinte, eleições de governadores e estas eleições municipais. Nestes três processos, o chavismo se remoralizou e repotenciou seu poder de convocatória eleitoral alçando-se com vitórias claras. Este não é um dado menor, entendendo que a narrativa antichavista dentro e fora da Venezuela sinalizou com consistência ao chavismo não querer disputar eleitoralmente.

2. A paz política e os votos: não deixa de ser relevante com estas eleições o desarme das aspirações de empurrar a Venezuela a um conflito civil patrocinado pelo antichavismo. O poder do voto como arma política conseguiu contrapor a imposição da violência que desestabilizou a Venezuela durante 2017. Sobre este aspecto em particular, o presidente Nicolás Maduro foi sumariamente insistente em buscar vias eleitorais para impedir que a violência descarnada que deteriorou o tecido político e social do país se converta em um cenário único e catastrófico.

3. O dimensionamento eleitoral do chavismo: o chavismo novamente pôs à prova suas capacidades de convocação e mobilização eleitoral consagrando-se como uma indiscutível força motriz, muito difícil de derrotar, mesmo em tempos de adversidade econômica e social. Isso implica que o capital político do chavismo não se sedimentou. Este resultado infere, além disso, que se reafirmou a identidade chavista assim como o uso cada vez mais eficiente de suas estruturas de mobilização. Também é apreciável o despertar ao comportamento eleitoral de importantes faixas sociais, que na Venezuela o contexto econômico não tem um impacto diretamente proporcional no feito político, mesmo que se condicione o clima de uma eleição, aparentemente de segunda ordem, como as municipais.

4. Algumas estatísticas se deslocam novamente: sucessivamente, a opinião venezuelana e particularmente Julio Borges e outros dirigentes do antichavismo insistiram inclusive até o mês de novembro o rechaço que o rechaço ao chavismo é igual ou superior a 80% da população. Os números de participação eleitoral e os resultados que colocam o chavismo como folgada maioria política deixam sem lastro matemático estas afirmações, base fundamental da propaganda de meios internacionais de grande audiência e de sanções de governos estrangeiros.

5. Ganhou a abstenção?: Certamente a participação de 47,32% dos eleitores deixa, como poucas vezes ocorreu em tempos de chavismo, uma abstenção superior a 50%. Este será um elemento empregado pela narrativa antichavista para deslegitimar os resultados e a vitalidade do sistema político venezuelano. O precedente eleitoral mais negativo foi nas eleições parlamentares de 2005, quando o antichavismo se retirou e a participação foi de 23%.

Estas eleições municipais foram atípicas, no sentido em que não se realizaram conjuntamente às eleições para governadores, o que também debilitou o poder de convocação das organizações participantes. As últimas eleições de caráter regional que tiveram participação mais baixa foram as regionais de 2012, com 52,85%. Para os padrões eleitorais venezuelanos a participação neste pleito foi relativamente baixa, mas é maior que o padrão de eleições muito mais relevantes em outros países latino-americanos cujas “democracias saudáveis” não recebem pressões e sanções dos grandes centros de poder global. O caso mais emblemático vem do Chile, onde em meados de novembro se realizaram eleições presidenciais, parlamentares e regionais, megaeleições, e a abstenção foi de quase 55%.

6. As capitais: o chavismo se alavancou com ao menos 20 das 24 capitais de Estados do país, incluindo o Distrito Capital, Caracas. Ganhou em municípios entre os mais densamente povoados do país (Maracaibo, Barquisimeto, Porto Ordaz, Valencia, Sucre-Miranda, entre outros) e se alça em cidades emblemáticas de Estados distintos, aprofundando seu alcance político em eixos territoriais que não conheciam vitórias chavistas em municipais há anos.

7. Persiste a polarização: o chavismo e os partidos políticos da oposição seguem sendo os dois sólidos pilares da confrontação eleitoral na Venezuela. Os resultados eleitorais diluíram toda aspiração política a candidaturas opositoras independentes e outras que se denominaram chavistas ao se apresentarem em paralelo. No caso deste segundo grupo, não conseguiram melar significativamente o apoio da base chavista ao PSUV e se consolidaram como um fenômeno do chavismo dissidente com presença digital (em meios digitais e redes), mais do que como força política real e mobilizadora. O caso mais significativo foi a vitória de Érika Farias na Prefeitura Bolivariana de Libertador com 66,17% dos votos (491.328), o que despejou as incógnitas sobre se a candidatura de Eduardo Samán, por fora do PSUV, poderia disputar boa parte da massa eleitoral do chavismo caraquenho.

8. A gestão na conjuntura: Um elemento convocatório e mobilizador do chavismo nestas eleições foi a capacidade de resposta do governo central no marco da conjuntura econômica atual. Pese não poder controlar a escalada de preços em produtos básicos, a gestão política e econômica do governo se focalizou em tornar mais eficientes mecanismos de proteção por meio do CLAP e do Carnê da Pátria, com o objetivo de focalizar os programas sociais e atender à população ante um vértice especulativo diário. Este, sem dúvidas, é um fator mobilizador do voto chavista.

9. O chavismo sim derrotou a oposição: antes destas eleições, três partidos dos 24 que integram a oposição venezuelana decidiram não ir às municipais: Ação Democrática, Primeiro Justiça e Vontade Popular, organizações que se autodenominam como as mais importantes. Com isso, tentaram criar a percepção de que o chavismo ia só às eleições. Não obstante, a imensa maioria de seus dirigentes locais se posicionou em outros partidos e participaram sem se camuflar nesta disputa, improvisando alianças com outras organizações e também contando com os recursos logísticos e financeiros de seus aparatos, que, em teoria, estavam fora do pleito. O resultado desta estratégia fatal foi uma apresentação ambígua dos filiados políticos frente ao eleitorado.

10. Divisão no antichavismo: a falta de coesão política da oposição se fez sentir, a ponto de levar à máxima expressão de seu desmembramento tático. Nestas eleições municipais, foram evidentes as divisões do voto opositor entre vários candidatos opositores competindo por um mesmo município. O fenômeno de fragmentação foi nacional e minimizou dramaticamente suas possibilidades. A luta intestina no antichavismo por aspirações pessoais de seus dirigentes tornou impossível que se apresentassem candidaturas únicas na maioria dos municípios, sacrificando com elas as aspirações de seus próprios seguidores em vencer ou manter municípios com a oposição.

11. O fator abstencionista: o antichavismo segue lidando com os dramáticos efeitos de sua escalada violenta deste ano, a qual fragmentou transversalmente a oposição de seus dirigentes a seus seguidores. Muitos deles se desvincularam da Mesa de Unidade Democrática (MUD) por conta da violência em 2017 ao associar a essa organização como politicamente inconveniente, mas, paradoxalmente, muitos seguidores desta coalizão deixaram de apoiar seus dirigentes uma vez que eles mantêm seus atos desestabilizadores para dialogar com o chavismo para “buscar garantias eleitorais”. Para este segundo grupo, altamente fanatizado por expectativas triunfais criadas, a MUD foi “domesticada” pelo chavismo e agora os assumem como “traidores”. A abstenção opositora acrescentou as possibilidades do chavismo em muitos municípios.

12. O fator de gestão local: muitos municípios nas mãos da MUD passaram às mãos do chavismo, o que se explica também pelo esgotamento da MUD como referência de gestão local. Caso emblemático é o do município de Sucre, do Estado Miranda. A má prática política de prefeitos opositores, que se declaram “sem recursos” e deixaram seus municípios se deteriorarem para responsabilizar ao governo central, teve o resultado da “abstenção castigo” da base eleitoral antichavista. A MUD em espaços locais não é referência real de um “câmbio” ou de um melhoramento das condições elementares de vida da população.

13. A inércia da depressão eleitora: o antichavismo parece desmoralizado, politicamente desarticulado e claramente desmobilizado. Sob as eleições municipais pesou a sensação de mal-estar generalizado que se acentuou logo depois das eleições regionais de outubro. Não se assumem convocados por seus dirigentes e estão marcados transversalmente pela apatia política.

14. Termina 2017: o presidente Maduro foi apresentado como principal candidato do chavismo para as presidenciais do próximo ano. Acaba 2017 como o máximo estrategista político, superando avatares inéditos e contra todas as previsões. Também consolida uma ampla base social remoralizada, reorganizada e mobilizada, logo depois de o chavismo ter sido assinalado insistentemente como força política prestes a desaparecer. Dito de outra maneira, são poucas as referências que se podem comparar a semelhante vulto político na história recente do país e Maduro conseguiu.

15. Presidenciais: a convocatória a eleições presidenciais é devida por decisão da Assembleia Nacional Constituinte e aos diálogos que o chavismo mantém com a oposição na República Dominicana nesta época. O antichavismo não consolidou uma liderança visível que aglutine suas forças políticas com olhar no próximo ano e assumiu essa etapa de diálogo por conta do aprofundamento de suas divisões internas.

Por fim
Os desafios do antichavismo seguem sendo consolidar uma liderança sólida e unitária, alcançar maiores níveis de coesão tática e estratégica e, por outro lado, erigir-se como uma força alternativa real, com projeto de país. Ou seja, fatores que não conseguiram em 18 anos e que só conseguiram breve e intermitentemente, e agora terão que consolidar isso em poucos meses. Sua única fortaleza real é uma base social com grande descontentamento econômico.

Para o chavismo, os desafios apontam a necessidade de restituir a governabilidade econômica, tornar mais eficientes os mecanismos de proteção social, relançar e blindar a relação entre a direção do chavismo e suas bases e, por outro lado, promover a identidade chavista para remoralizar ainda mais seu tecido político, o qual parece reanimado e articulado com as recentes vitórias eleitorais.

* Publicado originalmente no site Cubadebate.

0 comentários: