sexta-feira, 28 de julho de 2017

O mundo fantástico das delações premiadas

Por Miguel do Rosário, no blog Cafezinho:

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, foi aos EUA prestar contas de suas ações, mas não explicou porque, no Brasil, as delações premiadas se tornaram essa palhaçada.

Há alguns meses, uma delação bombástica ocupou a capa de todos os jornalões. Joesley Batista teria dito, em sua delação premiada, que Lula e Dilma tinham uma conta no exterior, onde receberam US$ 150 milhões em propina.

A notícia tem sido desmentida, desde então, em notas de pé de página.

Hoje, na coluna de Monica Bergamo, mais uma pá de cal sobre a mentira, que desmoraliza não apenas essa delação, mas o próprio Ministério Público Federal.




No mundo da razão, as informações acima significariam o seguinte: as contas não apenas nunca foram de Lula ou Dilma, como também não eram “separadas” para Lula ou Dilma. A história toda é uma mentira de Joesley.

Entretanto, a questão nem é mais a mentira – já confirmada de mil maneiras – de Joesley sobre essas contas e sim uma outra: por que Joesley mentiu? Ou: quais foram os procuradores que forçaram Joesley a mentir e dar declarações que iriam se tornar, imediatamente, capas de jornais e revistas?

O instituto de delação premiada tornou-se o principal instrumento do arbítrio. Setores do Ministério Público e da Polícia Federal, por sua vez, tornaram-se mais criminosos do que os bandidos que entrevistam.

Eu não aprovo a delação, nem a conduta desses empresários, mas os compreendo: sob ameaça de longas e ilegais prisões cautelares e da destruição de suas empresas, eles decidem fazer o jogo do MPF e falar qualquer coisa sobre Lula, Dilma e o PT. O prêmio é o maior de todos: a liberdade, em primeiro lugar, e a manutenção de seu patrimônio.

Veja o caso da Odebrecht e de todos os empresários: se tivessem, desde o primeiro dia, se decidido a contar as mentiras que os procuradores da Lava Jato exigiam, talvez pudessem ter salvo suas empresas. Como ainda possuíam um pouco de dignidade, resistiram o máximo que puderam. Possivelmente não acreditaram que os tribunais superiores iriam dar salvaguarda aos arbítrios de Sergio Moro. Nem seus advogados nem ninguém ousou imaginar que a Lava Jato estivesse disposta realmente a destruir o país inteiro apenas como fito de converter suas teorias mentirosas em depoimentos arrancados, sob tortura, dos réus.

Alguém poderá falar: ah, mas as contas existiam, multas foram pagas, etc. Sim, é claro que a Odebrecht e todas as empresas tinham contas no exterior. Era uma empresa que operava em mais de 20 países. É claro que eles tinham relações com políticos. É claro que não eram santos. Mas a Lava Jato precisava corroborar uma teoria específica, e para isso tinha de chantagear empresários e políticos.

Ainda na Monica Bergamo, que está sendo usada agora porque outros veículos já estão meio “queimados”, temos mais um vazamento típico da Lava Jato: antes mesmo das delações existirem. Quer dizer, agora houve uma inovação: a delação é vazada sem que se saiba quem é o delator.



Entenderam como é? Alguém, uma empresa, que você não sabe quem são, vai delatar Temer e Franco. Não se sabe o que vão delatar, quando vão delatar, se há provas ou não, mas a matéria já vale uma manchete.

É a desmoralização completa do instituto da delação premiada, esse excrescência importada dos Estados Unidos.

É bom repetir, sempre, as diferenças: nos EUA, a delação fica em sigilo absoluto. Se vazar, é anulada automaticamente. Aqui é vazada antes mesmo de existir e ninguém cogita anulá-la. Nos EUA, precisa ser acompanhada de provas. Aqui, não, apesar do falatório vazio de Janot: vide a condenação de Lula, inteiramente baseada numa delação informal, com direito inclusive a mentir, de Leo Pinheiro. Nos EUA, procurador é nomeado e demitido diretamente pelo presidente da república. Não tem autonomia. Aqui, é um príncipe mais poderoso que o presidente da república.

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