segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Sobre as eleições e os epitáfios

Por Valter Pomar, em seu blog:

Só tem algo mais chato do que uma derrota: os epitáfios escritos pelos inimigos, adversários e falsos amigos.

Contra eles, só há um antídoto: o exame da realidade, a busca das causas, retomar as energias e voltar a caminhar.

Ponto 1

Para começo de conversa: a esquerda já sofreu, está sofrendo e ainda vai sofrer derrotas piores do que as deste 2 de outubro de 2016.

Hoje sofremos derrotas eleitorais e golpes midiático-judiciais-parlamentares.

No passado não muito distante, enfrentamos assassinatos, desaparecimentos, torturas e golpes militares.

No presente, no mesmo dia 2 de outubro, o referendo colombiano disse não ao acordo de paz entre as FARC e o governo. Detalhe: lá como muitas vezes cá, a abstenção foi decisiva para o resultado.

No futuro próximo, notícias piores poderão vir, pois a direita brasileira vai redobrar sua ofensiva contra nosso partido, nossas lideranças e contra os movimentos e direitos sociais.

Como diria o Barão, nada está tão ruim que não possa piorar. Portanto, vamos preparar os ânimos.

Ponto 2

A derrota eleitoral de 2 de outubro de 2016 era uma catástrofe anunciada.

Os resultados de 2014.

A política adotada no início do segundo mandato Dilma.

A operação Lava Jato.

A ação do oligopólio da mídia.

As manifestações de massa da direita.

O impeachment.

As campanhas eleitorais, incluindo aí a linha de campanha, as alianças indevidas, o esconder da estrela e do Partido.

Antes mesmo das campanhas, a redução do número de cidades em que o PT lançou candidaturas (ver gráfico abaixo).

Em 2012 lançamos 1829 candidaturas a prefeito, em 2016 lançamos 995. Em 2012 lançamos 40 mil candidaturas a vereança, em 2016 lançamos 22 mil.

As pesquisas, que já indicavam o que estava por vir.

E os erros continuados de parcelas importantes da esquerda em geral e do PT em particular, tanto erros políticos quanto de outra natureza.

Ninguém pode alegar surpresa.

O que podemos, isto sim, é lamentar a mistura sempre fatal entre a dificuldade que muitos de nós tem de tirar consequências práticas da realidade e a facilidade com que vários de nós acreditam em conversa para boi dormir.

Ponto 3

A derrota foi do PT.

Nacionalmente, as candidaturas majoritárias do PT receberam cerca de 6,8 milhões de votos. Em 2012, havíamos recebido 17,2 milhões de votos.

Nacionalmente, o PT caiu de 630 para 231 prefeituras.

Em São Paulo caímos de 70 prefeituras conquistadas em 2012 para 8 agora (segundo que fomos ao segundo turno em Mauá e Santo André).

Segue a relação de cidades paulistas onde o PT venceu: Araraquara, Franco da Rocha, Itapirapuã Paulista, Barra do Chapéu, Rincão, Nantes, Cosmópolis e Motuca.

A derrota também nos atingiu em estados governados pelo PT. É o caso do Ceará, de Minas Gerais e também da Bahia, com redução no número de prefeituras e de mandatos de vereador.

Os estados do Acre e do Piauí apresentam outro quadro, que merece análise a parte.

Se considerarmos o número de pessoas que moram em cidades governadas por prefeitos/as petistas, a derrota vira desastre.

Em 2016 governávamos cidades onde residiam 37,9 milhões de pessoas. A partir de 1 de janeiro, vamos governar cidades onde residem 6,1 milhões de pessoas.

Tudo isto significa grandes dificuldades nos segundos turnos. A direita obviavamente fará de tudo para nos impor derrotas, por exemplo em Recife e Santa Maria.

O que significa dizer, também, que os poucos mandatos (vereanças e prefeitos/as) que conquistamos terão tempos extremamente difíceis pela frente.

Mas a derrota não foi só do PT.

Foi também do conjunto da esquerda.

O número de eleitores que votam na esquerda, em suas variadas expressões, é muito menor hoje do que nas eleições anteriores.

O que significa dizer que os partidos de esquerda que sonham em superar o PT pela via eleitoral, também verão pela frente tempos difíceis.

O PSOL, por exemplo, elegeu um número reduzido de prefeitos e de vereadores em todo o país. Se ganhar o segundo turno, passará a dirigir 5 (cinco) prefeituras. Sua votação caiu, entre o primeiro turno de 2012 e o primeiro turno de 2016, de 2,38 milhões para 2,09 milhões de votos.

Disputará o segundo turno em Belém e no Rio de Janeiro, onde terá que lidar com a tentativa de "domesticação" impulsionada pela Globo.

Ponto 4

Quem cresceu com a derrota do PT?

Principalmente o PSDB.

Ou seja: os fatos não confirmaram aquele discurso segundo a qual a derrota do PT seria acompanhada pelo fim da polarização PTxPSDB.

E dentro do PSDB, a grande vitória é do setor Opus Dei. Sendo que são tucanos 10 dos 23 milionários eleitos para governar prefeituras em todo o país.

Mas isto é acompanhado do crescimento de várias direitas, cuja administração se tornará mais difícil na exata medida do enfraquecimento do inimigo comum de todas elas, o PT.

A seguir a variação de vitórias por principais partidos, sendo o primeiro número referente a 2016 e o segundo referente a 2012. Mesmo sem considerar o número de habitantes por cidade, fica claro uma projeção tucana:

PMDB - 1041 / 1018
PSDB - 811 / 693
PSD - 543 / 494
PP - 495 / 467
PSB - 423 / 436
PDT - 342 / 308
PR - 299 / 274
DEM - 267 / 276
PTB - 266 / 295

PT - 263 / 627

Ponto 5

Dentre as várias causas da derrota do PT, a principal é a mesma que tornou possível o impeachment: perdemos apoio na classe trabalhadora.

Uma parte menor dos que nos apoiavam segue apoiando.

Outra parte menor votou em candidaturas de esquerda, não-petistas.

Uma parte maior passou a votar em candidaturas de centro e direita.

E uma parte também maior reforçou as fileiras do voto branco, nulo e da abstenção.

Os números de São Paulo capital são chocantes: Dória teve 3.085.187 votos. Já a soma de brancos, nulos e abstenções alcançou 3.096.304 votos.

Os números de Belo Horizonte também são chocantes: 38% do eleitorado de BH não votou em nenhuma das candidaturas a prefeito.

Em Porto Alegre, 382,5 mil eleitores e eleitoras não escolheram nenhum candidato no primeiro turno. Ou seja, um número maior do que o resultado obtido por Nelson Marchezan, que foi o mais votado e conseguiu 213,6 mil votos.

Este talvez seja o maior êxito da campanha da direita: reduzir os votos válidos, através da criminalização da política e dos políticos.

Os dados a seguir, divulgados no portal NEXO, mostram o histórico de crescimento dos brancos/nulos.

Os dados a seguir, da mesma fonte, confirmam o crescimento da abstenção,


A seguir, a queda no alistamento eleitoral de jovens entre 16 e 18 anos, quando confrontamos 2012 com os anos posteriores:


Ponto 6

Aqui e ali, há quem reclame do voto popular.

Não há dúvida de que uma parcela do povo votou contra seus interesses.

Não há dúvida, tampouco, de que uma parcela do povo deixou de votar e, com isto, também ajudou a prejudicar seus interesses.

Mas por quais motivos isto ocorreu? O que mudou entre 2012 e 2016, que causou mudanças no comportamento do voto popular?

A resposta é: nesse intervalo, a esquerda brasileira, destacadamente o PT, cometeu erros que alienaram parcelas importantes do povo e que facilitaram os ataques da direita.

Portanto, raciocínios do tipo "povo ingrato" servem apenas para mascarar as responsabilidades da esquerda, destacadamente do PT.

E por falar em responsabilidades: o resultado da eleição mostra, mais uma vez, que a eventual adoção do voto facultativo não favorece a esquerda.

Mostra, também, que o financiamento empresarial privado continua presente nas disputas eleitorais. O que, associado ao oligopólio da mídia, prejudica enormemente as candidaturas populares.

Ponto 7

Isto posto, como avaliar a frase de um cientista político, publicada na edição de hoje de um jornal paulistano, segundo a qual o PT tem "diante de si a tarefa dificílima de reconquistar a posição de líder do campo da centro-esquerda"?

A resposta é: querem que reincidamos no erro.

Pois foi a busca de ser líder do "campo da centro-esquerda" que nos levou à sucessivas rodadas de moderação programática e à sucessivas adaptações ao jeito tradicional de fazer política, que por sua vez levaram as derrotas dos últimos dias, semanas e meses.

Se o PT quiser "reconquistar" algo, deve ser a posição de líder do campo de esquerda, para o que precisa reconquistar a influência que perdeu na classe trabalhadora e nos setores populares.

A executiva e o diretório nacional do PT precisam reconhecer o tamanho da derrota, convocar imediatamente um congresso plenipotenciário, para mudar a linha do Partido e para escolher uma nova direção.

É isto ou suportar os epitáfios.

1 comentários:

Anônimo disse...

Au revoir PT!!! Podem chorar na porta da cadeia com os amiguinhos. Acabou.