sábado, 10 de outubro de 2015

RBS/Globo protege as “contas” de Nardes

Por Altamiro Borges

O ministro Augusto Nardes ganhou os seus minutos de fama nesta semana ao propor a rejeição das contas do governo Dilma. Seu frágil relatório, aprovado por unanimidade no anódino Tribunal de Contas da União (TCU), foi motivo de festança para os convidados especiais da sessão – entre eles, o fascista mirim Kim Kataguiri, o jagunço Paulinho da Força e vários parlamentares do PSDB, DEM e PPS. A mídia também deu destaque para a decisão “histórica”, afirmando que ela reforça a cavalgada pelo impeachment da presidenta. Todos os golpistas elegeram Augusto Nardes como o herói da semana. Mas a bajulação não vai durar muito tempo. Nesta semana, a Operação Zelotes confirmou que o “ético” ministro está metido num bilionário esquema de fraude fiscal no Rio Grande do Sul. Ele teria facilitado as mutretas da RBS, a afiliada da TV Globo no Estado.

Documentos apreendidos pela Polícia Federal revelam que Augusto Nardes ainda era um dos donos da empresa Planalto Soluções quando ela fechou parceria com uma das principais firmas de consultoria envolvidas no escândalo do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Segundo reportagem da Folha deste sábado (10), a empresa do ministro foi contratada pela SGR Consultoria, pertencente ao ex-conselheiro do Carf, José Ricardo da Silva, alvo das investigações da Operação Zelotes sobre a compra de decisões no órgão que analisa recursos contra multas. Augusto Nardes foi sócio da Planalto Soluções até maio de 2005. Seu sobrinho, Carlos Juliano, ainda é sócio da empresa.

A SGR é investigada por atuar em defesa da RBS – afiliada da Globo no Rio Grande do Sul e Santa Catarina –, que disputava no Carf a possibilidade de reduzir as multas aplicadas pela Receita Federal. Segundo as investigações, em 2011 a RBS pagou R$ 11,9 milhões para a SGR, que repassou R$ 2,55 milhões à Planalto entre dezembro de 2011 e janeiro de 2012. Os pagamentos coincidem com a vitória da RBS em um processo no Carf. E-mails enviados pela secretária da SGR ao dono da empresa mencionam pagamentos ao “Tio” e reforçam a suspeita de que Augusto Nardes recebeu pelos serviços prestados R$ 1,6 milhão. Já seu sobrinho Carlos Juliano abocanhou R$ 900 mil.

Ainda de acordo com a Folha, tão generosa no tratamento dos seus aliados pontuais, o ministro do TCU afirma que desconhece os “supostos” depósitos, nega a prática do crime de tráfico de influência e garante que “não assinou nada com a RBS”. Como álibi, Augusto Nardes argumenta que deixou a empresa Planalto Soluções em 2005. Ocorre que os documentos vazados confirmam que a RBS contratou a SGR em março deste mesmo ano e que esta, por sua vez, subcontratou na sequência a firma do impoluto ministro. A saída de Augusto Nardes do seu quadro societário só ocorreu em maio de 2005, 42 dias após o contrato com a SGR. Será que o servicinho prestado à RBS ajuda a explicar porque a TV Globo deu tanto destaque à “votação histórica” no TCU?

Sobre a patética rejeição das contas do governo Dilma vale conferir o excelente artigo de André Singer, publicado neste sábado na Folha:

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Falso brilhante

A operação cênica do Tribunal de Contas da União, encerrada minutos antes de começar o "Jornal Nacional", merece entrar para a história dos escândalos políticos-midiáticos. Um órgão de assessoria parlamentar que se passa por corte para, em dizeres altissonantes, condenar unanimemente, e em rede de TV, a presidente da República por "desgovernança fiscal". Pode ser que o impeachment não prospere nunca, mas do ponto de vista ideológico Dilma Rousseff foi impedida na noite de quarta (7).

Os fundamentos objetivos da condenação, no entanto, passam batidos. Desculpe-me o leitor por obrigá-lo a assunto tão árido, porém não há outro modo de abordar o tema. Tomarei apenas um exemplo, referente às supostas "pedaladas fiscais", para indicar como as evidências são fracas.

Vazado em linguagem cifrada, o voto do relator busca fixar a ideia de que em 2014 a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) teria sido burlada de maneira criminosa por meio das pedaladas. Como prova, menciona-se a páginas tantas que as contas relativas à Bolsa Família, ao Seguro Desemprego e ao Abono Salarial, gerenciadas pela Caixa Econômica Federal (CEF), teriam ficado negativas em 59% dos dias daquele ano.

O TCU considera que, ao deixar no vermelho o saldo dos referidos pagamentos, a União estaria usando dinheiro emprestado da CEF, o que seria proibido pela LRF. Com efeito, produzida, entre outras coisas, para conter o uso dos bancos públicos, ela proíbe que o Estado receba crédito de casa bancária por ele controlada.

Ocorre que a resposta do Advogado-Geral da União, neste particular, foi precisa. Na defesa oral apresentada perante os ministros, Luís Inácio Adams lembrou que, ao final de 2014, o Tesouro tinha a receber da CEF 141 milhões de reais. Onde já se viu tomador de empréstimo receber em lugar de pagar dívida contraída?

A charada se resolve se pensarmos que não houve empréstimo algum. Os ministérios têm um contrato de serviço com a CEF, que administra as sobrecitadas contas. Nos dias em que ela fica negativa, produz-se um haver em favor do banco, quando positiva, em favor do Tesouro, procedendo-se a um ajuste entre uns e outros. No caso de 2014, quem devia era a Caixa e não a presidente. Onde o crime, então?

A imprensa, se quiser prestar um serviço à democracia, tem a obrigação de destrinchar o que está contido nas milhares de páginas oficiais escritas sobre o caso. Diferentemente dos episódios de corrupção, tudo está à mostra e pode-se chegar a conclusões claras.

Ao governo cabe promover ampla campanha de esclarecimento. Se não o fizer, deixará o principal argumento pró-impeachment tomar conta do público por mera repetição.


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