quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Mídia criminaliza as lutas populares

Por Nadine Nascimento, no jornal Brasil de Fato:



A 1ª Feira Nacional da Reforma Agrária também se configurou como um espaço para se discutir a relação dos movimentos sociais com a mídia no Brasil e países latino-americanos. Promovido pelo Brasil de Fato, em parceria com o Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, o seminário "Mídia e lutas populares no Brasil e na América Latina" aconteceu, neste sábado (24), no auditório do Instituto da Pesca do Parque da Água Branca, em São Paulo.

O jornalista e escritor Fernando Morais, a jornalista Renata Mielli, do Barão de Itararé e integrante do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e a jornalista Marilu Cabañas, da Rádio Brasil Atual, comporam a disussão. Ambos questionaram o monopólio da mídia nos países latino-americanos, que tentam invisibilizar as lutas dos movimentos sociais, e o papel da imprensa alternativa em dar espaço a estes grupos. Além disso, os presentes falaram do papel da internet como uma plataforma que potencialize o alcance das pautas de luta.

Expondo que a imprensa nos países latino-americanos surgiu a serviço dos interesses privados, a dos empresários, Renata Mielli afirmou que, portanto, os grandes veículos de comunicação tem como viés a aversão aos movimentos sociais. "As lutas dos camponeses e dos trabalhadores rurais é invisibilizada e criminalizada pelos meios de comunicação, porque suas pautas vão de encontro com os interesses dos financiadores dessa mídia", disse.

Para ela, o uso da palavra "invasão" na retratação das atividades do movimento pela imprensa seria uma forma de desacreditá-lo, por exemplo. "Quando se faz o uso da palavra 'invasão', no trato das atividades do MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra], dá sentido diferente de 'ocupação'. Invasão é uma violência, tem outro sentido político. Ocupação é ocupar um espaço desocupado, improdutivo", explicou.

A jornalista do Barão de Itararé vê a internet como uma plataforma com grande potencial para veicular as informações dos veículos alternativos. "A internet tem papel fundamental para potencializar a força dos movimentos sociais e a mídia alternativa, a partir da internet, floresce e se potencializa. Vamos nos reproduzindo nesse ambiente virtual que tem se mantido como fundamental para a gente fazer esse contraponto aos veículos hegemônicos", concluiu.

O papel do jornalista e da imprensa alternativa foi o centro da fala de Marilú Cabanãs, que também falou das suas dificuldades e experiências ao trabalhar em grandes veículos de comunicação, que, na ânsia pela espetacularização da notícia, ultrapassam muitos limites do jornalismo. Para ela, o jornalismo alternativo tem que ir na contramão de tudo isso.

"Deveríamos nos basear na competência e honestidade, com o compromisso com o jornalismo e com a questão cultural. Se a gente coloca as notícias que os outros não dão, temos que tocar em nossa rádio as músicas que eles não tocam também, temos que ter uma programação cultural de qualidade", disse.

Sobre a integração do Brasil com os outros países da América Latina, ela deixou claro que precisamos avançar muito mais. "Não sabemos nada de 'nuestros hermanos'. Só sabemos as músicas norte-americanas, que não tem nada a ver com nossa identidade cultural", disse.

Também sobre a América Latina, o jornalista e escritor, Fernando Morais criticou o atraso do Brasil em relação aos outros países latino-americanos em regulamentar o setor da comunicação. Para ele, o atraso muito se dá pela resistência dos brasileiros que veem equivocadamente a medida como algo de "países comunistas como Cuba".

"Para regulamentar a mídia é necessário colocar em prática os métodos usados nos EUA, país extremamente capitalista, onde quem tem rádio, não pode ter TV, não pode ter revista, não pode ter jornal. A Rede Globo usa seus meios de comunicação para promover seus próprios veículos", criticou. Para o jornalista, "faltou convicção para implantar um projeto alternativo e mudar a mídia atual".

Ao falar da importância do jornalismo pautado pelos movimentos sociais e pelos trabalhadores, Fernando Morais, também fez questão de lembrar da morte do jornalista Vladimir Herzog. "Há exatos 40 anos o jornalista Vladimir Herzog era preso pelo Doi-Codi para ser morto na manhã seguinte no quartel. Faço uma homenagem a memória dele que é um exemplo para todos nós", frisou.

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