domingo, 25 de janeiro de 2015

Avanços e perigos na América Latina

Por Altamiro Borges

Eleito com 61% dos votos em outubro passado, o presidente Evo Morales tomou posse nesta quinta-feira (22) para o seu terceiro mandato. Na solenidade, o líder indígena destacou os avanços do seu governo – crescimento econômico de 5,5% em 2014, redução da miséria (hoje em 11%) e maior soberania da Bolívia (com a nacionalização das riquezas naturais, como os hidrocarbonetos, e as estatizações em áreas estratégicas). Ele também criticou as políticas dos seus antecessores de submissão aos EUA. A cerimônia de posse foi prestigiada pela brasileira Dilma Rousseff, o venezuelano Nicolás Maduro e o equatoriano Rafael Correa, entre outros governantes da América Latina. Ele confirmou que a região segue o seu curso progressista, com presidentes mais comprometidos com a democracia, os avanços sociais, a soberania e a integração regional.

Balanço feito pela jornalista Théa Rodrigues, no site Vermelho, mostra a América Latina – formada por 20 países e com mais de 600 milhões de habitantes – teve sete eleições presidenciais em 2014. Na maioria delas, as forças progressistas sagraram-se vitoriosas. Vale conferir:

Costa Rica

A Costa Rica realizou eleições presidenciais no dia 2 de fevereiro. O pleito deu a vitória ao historiador Luis Guillermo Solís Rivera, do Partido Ação Cidadã, que chega pela primeira vez ao poder. Ele derrotou no segundo turno o candidato apoiado pela ex-presidenta, Laura Chinchilla, do conservador Partido Liberação Nacional.

El Salvador

Em El Salvador, o histórico líder guerrilheiro Salvador Sánchez Cerén, da Frente Farabundo Martí para Libertação Nacional (FMNL), venceu os dois turnos das eleições – em 2 de fevereiro e 9 de março. Ele sucede o jornalista Mauricio Funes, da mesma legenda, e mantém o projeto popular de governo. Obteve 50.11% (1.495.815 votos), derrotando o candidato da direita, Norman Quijano, da Aliança Republicana Nacionalista (Arena).

Panamá

No Panamá, onde não há segundo turno, a população trocou um governo de direita por outro também de matriz conservadora. Em 4 de maio, o ex-vice-presidente Juan Carlos Varela foi eleito com 724.762 (39,1%) votos pela aliança El Pueblo Primero. Ele derrotou o candidato apoiado pelo governo, José Domingo Arias, e o ambientalista Juan Carlos Navarro, do Partido Revolucionário Democrático.

Colômbia

O presidente Juan Manuel Santos foi reeleito no segundo turno em 25 de junho, após uma acirrada disputa contra o ultradireitista Óscar Zuluaga – candidato do ex-presidente Álvaro Uribe. Ele obteve 50,95% dos votos. Apesar de ser um político conservador, sua vitória foi festejada pelas forças políticas que defendem a paz no país e a continuidade das negociações com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).

Brasil

Em 26 de outubro, os brasileiros reelegeram Dilma Rousseff com 54.501.118 de votos, derrotando o tucano Aécio Neves, que obteve 51.041.155. “O país viveu uma disputa acirrada e um reagrupamento da direita em torno da campanha para derrotar o avanço das forças progressistas. Foi a quarta vitória consecutiva das esquerdas – processo iniciado com a conquista da Presidência por Lula, em 2002”, descreve Théa Rodrigues.

Bolívia

Em 12 de outubro, o presidente Evo Morales, do Movimento ao Socialismo, conquistou o seu terceiro mandato na Bolívia, com 61,04% dos votos. Ele derrotou o opositor Samuel Doria Medina, da Unidade Nacional, que obteve apenas 24,49% dos votos. “Apesar da corrida eleitoral ter tido 12 partidos, nenhum dos candidatos teve força política suficiente para bater de frente com o atual presidente”.

Uruguai

O ano eleitoral na América Latina se encerrou com a vitória da Frente Ampla no Uruguai em 30 de novembro. No segundo turno, o ex-presidente Tabaré Vázquez foi eleito para substituir o popular Pepe Mujica. Ele obteve 1.226.105 votos (56,62%) e derrotou o conservador Luis Lacalle Pou, do Partido Nacional.

A vitória histórica de Cuba

Além das vitórias eleitorais, as forças de esquerda na região também comemoraram uma importante conquista no final de 2014. Após mais de 50 anos de criminoso bloqueio, os EUA reconheceram a derrota da sua política agressiva e deram início ao reatamento das relações diplomáticas com a heroica Cuba. Em discurso conjunto em 17 de dezembro, os presidentes Barack Obama e Raul Castro anunciaram este feito histórico. Entre outros fatores, os avanços das forças progressistas na América Latina e a maior integração regional garantiram esta vitória parcial.

Para o jornalista Beto Almeida, conselheiro da Telesur, o reatamento das relações diplomáticas é um dos fatos mais marcantes dos últimos anos. “O povo cubano resistiu por décadas ao isolamento e venceu. Cuba se tornou um país importantíssimo no mundo em várias áreas, como saúde e educação. Cuba nunca precisou abrir mão de seus princípios para se reestabelecer no mundo”, afirma. “A América Latina fez o contrário do que os EUA fizeram com Cuba durante todo esse tempo. Chamou o país para construir junto uma política regional independente e colocou o país no mapa da América Latina. O porto de Mariel, por exemplo, é reflexo dessa estratégia geopolítica vitoriosa”.

Perigos na espreita

Estas vitórias, contudo, não permitem uma leitura ufanista das forças progressistas. A região ainda enfrenta enormes desafios. A pobreza é uma chaga no continente, fruto de séculos de colonização e de décadas de domínio de oligarquias submissas aos EUA. A crise econômica que afeta o sistema capitalista prejudica os esforços dos países da região, que não são uma ilha num mundo em declínio. Os povos da região conquistaram governos progressistas, mas tomaram o poder; venceram eleições, não fizeram revoluções; derrotaram o neoliberalismo nas urnas, mas ele segue hegemônico na sociedade.

Em decorrência destas e de outras limitações, muitos países da América Latina passam por um período de dificuldades e turbulências. Há riscos de a direita voltar ao poder na Argentina ainda neste ano. O país está estrangulado economicamente e sofre intensa pressão desestabilizadora. Já Venezuela, a oligarquia local, apoiada pelos EUA, aposta na crise de abastecimento para desgastar e derrubar Nicolás Maduro. Já no Brasil, apesar da recente e épica reeleição de Dilma Rousseff, a situação também é instável. As forças derrotadas nas urnas se reagruparam para impor a sua agenda ao novo governo e para “sangrá-lo”. Em síntese: importantes vitórias e enormes desafios para as forças progressistas da região.

Os dilemas de Clóvis Rossi

Com a sua visão atucanada, o jornalista Clóvis Rossi, da Folha, sintetizou os dilemas do próximo período. “Os governos ditos populistas passaram garbosamente, em 2014, pelos desafios eleitorais a que foram submetidos na Bolívia, Brasil e Uruguai. Mas é este 2015 que vai, efetivamente, testar nas urnas a saúde do populismo”. Reproduzindo a visão de um setor da burguesia, ele afirma que os governos progressistas da região são um desastre na economia. Rossi até elogia alguns avanços sociais, mas garante que este “modelo está esgotado”. Cita como exemplo a Venezuela – um dos alvos preferidos da sua coluna diária na Folha tucana.

“O populismo chavista conseguiu reduzir a pobreza de 51,7% no ano 2000 a 29% em 2012, de acordo com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Deu a uma massa de venezuelanos, pela primeira vez, a sensação de que eram cidadãos e não marginais. Parabéns. Mas o modelo está esgotado. A Venezuela de Nicolás Maduro é uma ruína econômica sem contemplações”, afirma. Para ele, ou o presidente se “rende ao livre jogo do mercado” ou caminhará para o autoritarismo. “As eleições venezuelanas – que, no chavismo, foram razoavelmente livres, mas não justas – perderiam ambas as características, e a Venezuela deixaria de ser uma democracia”.

Apesar de distorcido, o diagnóstico formulado pelo jornalista da Folha confirma que a América Latina vive uma encruzilhada.

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1 comentários:

Anônimo disse...

A Europa está chegando para nos ajudar.
Está começando pela brava Grécia. Adeus Velha Europa!!! Adeus Austeridade!!! Bem vindos ao futuro!!!