sábado, 14 de dezembro de 2013

STF não é lugar para super-heróis

Por Luis Nassif, no Jornal GGN:

Mídia e Ministério Público: duas coisas que não têm se misturado bem como água e óleo: um precisa do outro, mas nenhuma instituição tem sabido dialogar bem com a outra. A opinião é de Aurélio Rio, Procurador Federal dos Direitos dos Cidadãos durante o Seminário “A democracia digital e a Justiça”, promovido pelo Jornal GGN em parceria com a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) nacional.

Grande parte da mídia e dos jornalistas não entendeu bem o papel do MP depois da Constituição, diz Rios. “O que tem aparecido com frequência irritante é o promotor acusador, pedindo a execução da pena de imediato. E a parte criminal não é a única nem a mais importante função do Ministério Público”, diz ele.

O MP atua junto à Justiça Eleitoral, em favor das eleições limpas, de candidatos limpos, de um processo democrático.

Na Constituinte, houve duas propostas em discussão em relação ao MP.

"Vamos criar a figura do ombudsman, defensor do povo. Ou aproveitaríamos uma instituição recém-emponderada, com as mesmas garantias da magistratura, e emponderava com ação de defesa da sociedade. O Congresso decidiu contra si mesmo, transferindo para MP a defesa dos direitos da sociedade", conta Rios.
Os trabalhos poucos divulgados

Segundo Rios, hoje em dia há enorme trabalho de cidadania em andamento. Recentemente, o MPF evitou o despejo de 10 mil pessoas em Uberlândia. “Mas não houve interesse da mídia em cobrir”. Um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) sobre inclusão digital permitiu que pessoas com deficiência passassem a utilizar terminais bancários.

Para Rios, o problema maior é que os casos criminais sempre atraem mais leitura do que os demais. Foi assim com o julgamento do mensalão e com o caso Lindbergh nos Estados Unidos (o sequestro e assassinato do filho de Lindbergh, primeiro aviador a atravessar o Atlântico). “Desde então, a mídia reproduz esses shows, como foi o caso Nardoni”, exemplifica ele.

Direito não é ciência exata, lembra Rios. O risco é quando a cobertura expõe apenas uma visão, quando mistura juízes e promotores midiáticos sem controle, com o “on” permanente ligado. Ai é o promotor que virou justiceiro, o juiz que virou super-herói”, diz ele.

Rios é incisivo: “O STF não é lugar para super-heróis, mas para juízes com maturidade, com capacidade de pensar e refletir sobre as consequências de seus atos. O STF é o último tribunal com direito de errar”.

E aí se chega aos inconvenientes da divulgação instantânea pela TV Justiça. “É muito ruim, porque suscita um conflito de vaidades. Causas desimportantes passam a ser divulgadas com votos longos, quando seria muito mais interessante ouvir-se apenas o voto do relator, e os demais apresentarem o voto por escrito”.

Os prejuízos para a imagem do Judiciário não se revelam apenas nos bate-bocas, na deselegância, “mas na ideia das pessoas de que a justiça é feita de acordo com a ocasião, com o que a opinião pública indica”. O juiz tem que ter o afastamento necessário inclusive para julgar contra a corrente, diz Dias. “A face mais legitima do STF é quando investe contra a maioria para defender direitos das minorias”, diz ele.

No entanto, em uma situação de crise, de exposição aguda de imagem, diz ele, é muito difícil que se julgue com isenção. “Nenhum juiz ou procurador está livre de sua dimensão humana”, diz Dias.

Hoje em dia se vê por todos os lados a falta de respeito com relação à pessoa do acusado, à pessoa detida em poder do Estado. “Quando há réus desimportantes, é pior ainda, nos programas jornalísticos nos quais os próprios repórteres submetem presos a vexames’, diz ele.

Há muitos desafios pela frente. “Como proteger o promotor que vai atuar na área penal, com a avalanche de jornalistas em cima dele?”, indaga Rios. Isso cria problemas sérios no campo disciplinar, menos pelo que promotores fazem, mais pelo que anunciam que irão fazer.
A relação com a parte vulnerável

Presidente da Comissão de Direitos Fundamentais do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), o procurador Jarbas Soares concorda que a parte mais relevante do Ministério Público é a de defesa da parte mais vulnerável da sociedade, “aquele olhar para os lascados, como disse Gilberto Carvalho.

Embora não seja órgão de atuação, de atividade-fim, o CNMP é o único com institucionalidade e estrutura nacional para unir todas as unidades do MP – do Federal aos estaduais.

Seu papel é o de buscar a unidade e montar projetos nacionais.

Soares destaca três pilares:

1. Bom funcionamento dos controle internos: CNMP e corregedorias funcionarem. Com MP solto e desamparado e cada colega se sentindo o próprio MP sem o mínimo de unidade, as críticas vão aumentar, e com razão. Haverá novos projetos contra o MP, como foi a PEC 37.

2. Dispondo de recursos, e com capacidade de atuar nacionalmente, o CNMP montou um planejamento estratégico para o próximo ano, contemplando as principais áreas de atuação com direitos humanos.

3. Apresentação de resultados.

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