terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Os tucanos e o cheiro de naftalina


O lançamento burocrático do nome de Aécio à sucessão de Dilma Roussef, feito por apressados tucanos nesta segunda-feira, exala o odor da naftalina entranhada nas peças do vestuário preteridas no guarda-roupa. Quando finalmente ascendem à luz, já perderam a sintonia com o manequim e a estação.

Ungido no vácuo, Aécio ainda gaguejou assombrado: 'antes de candidatura, a legenda precisa de agenda'

Não sem razão. O credo do PSDB transformou-se num pé de chumbo histórico. Hoje ele pisoteia o que restou do Estado do Bem Estar Social europeu superpondo o arrocho ortodoxo ao colapso neoliberal. Apaga incêndio com gasolina

As labaredas atingiram a classe média europeia da qual o tucanato um dia considerou-se uma espécie de prefiguração tropical culta, rica, bela e cheirosa.

19 milhões de desempregados, quase 120 milhões na ante-sala da pobreza, revestem a zona do euro das cores de uma tragédia histórica feita de despejos, suicídios, fome e pobreza, em escala e virulência desconhecidas desde a Segunda Guerra.

A candidatura Aécio é isso: o choque de gestão de Alckmin algemado ao descrédito planetário da bandeira dos mercados autorreguláveis. Queira ou não, sua candidatura vestirá o que lhe resta --a camisa conservadora impregnada da naftalina udenista.

O único plano de voo tucano é a aposta no acuamento político do PT e do governo Dilma.

Depende muito de como o outro lado reagir.

A inexistência de um contraponto estruturado de mídia progressista, por exemplo --ontem e ainda hoje menosprezado pelo governo Dilma-- amplifica o alcance dessa ressurgência udenista, cuja chance de volta ao poder pressupõe nada menos que a destruição de Lula e o engessamento de sua sucessora.

Não é único flanco de um viés de complacência cada vez mais temerário.

O PT de certa forma foi uma costela emancipada da efervescência cristã-progressista semeada pela Teologia da Libertação nas periferias metropolitanas. A ela associou-se a energia sindical amadurecida nos levantes metalúrgicos do ABC paulista, nos anos 70 e 80.

Dessa simbiose de forte capilaridade emergiram lideranças e quadros que iriam catalisar segmentos egressos da luta armada, intelectuais de esquerda,cristão progressistas e democratas em geral, na construção de um novo partido socialista, libertário e ecumênico.

O êxito eleitoral fulminante associado ao revés simultâneo da ala progressista da igreja católica contribuiria para o duplo desmonte da enraizamento original pela base.

O jogo eleitoral absorvente impôs a sua lógica absolutista na vida interna do partido; o golpe conservador dentro da Igreja Católica reproduziria o mesmo vácuo nas periferias crescentemente colonizadas pela individualização evangélica.

A vitória de Fernando Haddad em São Paulo reabre essa página da história.

A partir de São Paulo o PT pode - se quiser - renovar o arsenal de políticas públicas, ao mesmo tempo em que regenera a capacidade de organização pela base.

Seria uma demonstração de discernimento histórico da nova gestão petista, por exemplo, criar uma Secretaria de Participação Cidadã.

Sua missão democrática seria reativar a nucleação suprapartidária da cidadania em torno de questões cruciais que atormentam o cotidiano dos bairros de classe média, dos conjuntos populares e das periferias distantes.

O renascimento da participação comunitária impulsionado pelo recorte ecumênico, pavimentaria a realização de grandes conferencias municipais temáticas. Nelas, delegados de classe média e de cinturões populares pactuariam suas prioridades para São Paulo.

O processo ganharia difusão através de uma rede de mídia alternativa capaz de amplificar a mais significativa virada cultural na gestão de uma metrópole no século XXI: o protagonismo democrático de seus habitantes.

A vitalidade participativa em uma das cinco maiores manchas urbanas do planeta sacudiria a vida política do país e a letargia interna do PT.

Faria mais que isso:fomentaria um anteparo de discernimento popular com densidade capaz de resistir ao golpismo conservador que, queira ou não Aécio, deve cavalgar a sua candidatura a 2014 - se e até quando ela sobreviver à liquefação neoliberal.

2 comentários:

Ignez disse...

Em cada um de nós ressurge a esperança pela eleição de Haddad. Os tempos são outros, mas as baratas sempre surgem de fendas escuras, de buracos fedorentos de maneira inesperada. Nada como uma mobilização de núcleos comunitários para amedrontá-las.Um E Haddad pode seguir esse caminho de libertação das pragas. É hora de arejar São Paulo!Excelente sugestão, Saul.

Under_Siege@SAGGIO_2 disse...

Esperando um post sobre o PSDB x POVO/Estado Brasileiro no caso das Eletricas dominadas pelo PSDB em MG/SP/PR.

Prato cheio pra lembrar que PSDB é do "mercado" e contra nós!!!

Teve depoimento do Aébrio no Senado contra diminuir conta de luz. Que tal?

Bom dia, Miro!