quinta-feira, 29 de novembro de 2012

“Agiam como se não existisse ética”

Do Observatório da Imprensa:

O juiz Brian Leveson e sua equipe de advogados recomendaram um sistema fortalecido de autorregulação para a indústria jornalística do Reino Unido, que seria respaldado por uma mudança na lei britânica. Eles reuniram evidência de mais de 600 testemunhas – incluindo celebridades, políticos e editores – a pedido do primeiro-ministro David Cameron, que ordenou uma investigação judicial no auge do escândalo dos grampos telefônicos do News of the World, jornal de Rupert Murdoch, em julho de 2011. O relatório final – com quase duas mil páginas – foi publicado na quinta-feira (29/11).

No relatório há muita informação sobre a família Murdoch – Rupert e seu filho James – com centenas de referências à News Corporation. “Muitas vezes, ao perseguir uma pauta, alguns veículos de imprensa agiram de acordo como se seu próprio código [de ética] não existisse”, escreveu Leveson no relatório. “Isso causou sofrimento e, ocasionalmente, destruiu vidas de pessoas inocentes cujos direitos e liberdades foram desdenhados.”

Leveson criticou Murdoch por falhar em descobrir a má conduta jornalística no News of the World depois que um repórter e um investigador policial que trabalhava para o jornal foram presos em 2007. O juiz classificou o tabloide como um dos veículos britânicos que usaram “vigilância secreta” e “fraude” para obter matérias sem interesse público.

Novo órgão respaldado por lei

Leveson recomendou que o Parlamento britânico aprove uma legislação que reconheça oficialmente o novo órgão regulatório e identifique um conjunto de requerimentos que devem ser atingidos para ser considerado eficiente em servir ao público. Ele recomendou que a legislação garanta a liberdade de imprensa e sugeriu que o Ofcom (Office of Communications), o regulador da comunicação no país, garanta a supervisão da independência e eficiência do órgão. O juiz disse que a imprensa deve permanecer livre. “Isso não é e não pode razoavelmente ser caracterizado com uma regulação estatutária da imprensa”, disse.

A participação no novo sistema regulatório deve ser voluntária para os jornais britânicos, embora deva haver incentivos para se tornar membro, por meio de custos legais reduzidos em casos de ações sobre privacidade e difamação. O novo regulador seria administrado por um conselho, cuja maioria dos integrantes, incluindo o presidente, deve ser de “pessoas independentes da imprensa”. “Os políticos devem decidir quem guarda os guardiões”, aconselhou o juiz.

Leveson também passou meses analisando a relação da mídia com a polícia. Convém lembrar que funcionários da alta administração corporação renunciaram no auge do escândalo. Segundo o juiz, não há como questionar a integridade da polícia, mas ele reforçou que policiais deram muitas informações à mídia.

Reações do Parlamento e da mídia

Algumas das propostas de Leveson não agradaram o Parlamento. Em um pronunciamento, Cameron viu com bons olhos o pedido de um novo órgão regulador “com poder de pedir retratações e impor multas”, mas expressou preocupações sobre apoiá-lo em lei. “Tenho receios sobre essas recomendações. Não importa quão simples seja a intenção da nova legislação, a lei necessária para respaldar o órgão regulatório seria mais complicada”.

Mas Ed Miliband, líder do Partido Trabalhista, de oposição, disse que as propostas devem ser adotadas pelo Parlamento do jeito como foram apresentadas por Leveson. O vice-primeiro-ministro, Nick Clegg, cujo partido Liberal Democrata é coligado com o Partido Conservador de Cameron, disse que sua preferência era criar um sistema rigoroso sem nenhuma legislação. Ele, entretanto, expressou apoio para mudança, diante da falta de alternativas.

Em editorial, o Financial Times elogiou Cameron, afirmando que ele está certo em dar atenção aos riscos de qualquer intervenção nos jornais. Tom Mockridge, CEO da News International, braço britânico de jornais da News Corporation, afirmou que a regulação pode ser feita sem um estatuto.

Em uma coletiva de imprensa nesta semana, o grupo Hacked Off, formado por vítimas de grampos como o ator Hugh Grant, especialistas de jornalismo e outros, pediram ao primeiro-ministro para reconsiderar sua posição e apoiar uma nova lei britânica. No Twitter, Grant disse que as vítimas de invasão de privacidade sentiram-se traídas por Cameron.

Confira aqui a íntegra do relatório, em inglês.

[Com informações de Paul Sonne e Jeanne Whalen, do Wall Street Journal, 29/11/12]

* Tradução e edição: Larriza Thurler

3 comentários:

Fábio disse...

Não seria mais apropriado dizer que a mídia inglesa agia exatamente como as empresas jornalísticas brasileiras de capital aberto aos negócios criminosos do Cachoeira?

Policarpo Jr., da Veja, pode ter sido o primeiro jornalista brasileiro a fazer escola na Inglaterra. Mas a escola foi fechada pelo Parlamento porque ao contrário do Brasil, o cachoeirismo lá não é considerado uma "escola do bem".

Ignez disse...

Então, há "recuos" também, no Reino Unido, em? De toda forma, o cidadão britânico foi colocado a par da questão. Aqui, a única agenda que contempla oassunto é promovida pela própria mídia. E, lógico, sob o enfoque de censura. Uma ação mais ampla do ministro das Comunicações seria bem vinda, ao menos para respaldar o esforço que vem sendo feito na internet para divulgar o assunto.

Anônimo disse...

Eu troco um Barbosão Capa Preta Capitão do Mato pelo juiz Brian Leveson.

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Helder