segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Eleição e a manipulação da "ética"

Por Mauricio Dias, na CartaCapital:

Lula ganhou a eleição presidencial em 2002. Tinha uma aprovação pessoal grande e a avaliação do governo dele em nível elevado. A oposição não sabia como se opor àquele governo que não naufragou de imediato como ela esperava e torcia. Frustrou-se.

O governo fez o dever de casa. Foi comedido, comportado, conservador. Sacrificou o crescimento econômico pelo superávit primário. Embora tivesse base de apoio no Congresso capaz de permitir ousadias, conteve-se. O programa Bolsa Família, criado em 2003, é uma exceção que confirma a regra.

Em 2005, no entanto, explodiu a denúncia do “mensalão” e despertou na oposição o velho sentimento moralista da extinta UDN. Era a bandeira que faltava para guiar as insatisfações e retomar o poder para os tucanos. Delenda Lula.

Entrou em ação a “banda de música” udenista e com ela o uso político, ou manipulação, do tema corrupção, ampliado pelas trombetas da mídia. A ética foi escancaradamente banalizada e alcançou até mesmo a tradicional distribuição de cargos da máquina pública. Antes aceita, passou a ser condenada. Chegou-se à criminalização da política. Alguns índices de abstenção no primeiro turno das eleições municipais de 2012, ainda em curso, refletem isso.

Apesar disso, a propaganda do combate à corrupção não deu certo. Em 2006, Lula foi reeleito e, em 2010, elegeu Dilma. Um ás que tirou da manga.

O que falhou no golpe da oposição? Basicamente, faltou combinar com o eleitor. Chegou-se a achar que o povão, o eleitor pobre, não tinha ética. O povo, porém, como apregoa conhecido refrão, não é bobo. Tinha, na verdade, a informação essencial transmitida pelos benefícios de uma administração que resgatava milhões de marginalizados para incluí-los no processo econômico. A coisa não para por aí. Tem mais.

Recentemente, Márcia Cavallari, diretora-executiva do Ibope, concluiu um levantamento sobre mudança na agenda dos “principais problemas brasileiros”, segundo o eleitor. Os dados são tirados, essencialmente, das pesquisas daquele instituto. Em 21 anos, de 1989 a 2010, houve alterações significativas nessa agenda.



Tabela com os principais problemas dos brasileiros, segundo pesquisa Ibope

Observados os porcentuais do levantamento e, claro, principalmente os resultados das urnas nesse período, fica bem visível que o eleitor, embora condene, não vê a corrupção como principal adversário. No período pesquisado, o combate a esse crime baixou do quinto para o sexto lugar no elenco dos problemas a partir da queda de 5 pontos porcentuais na escala das indicações.

Curiosidade à margem do tema: caiu radicalmente a preocupação com a inflação, diminui significativamente a preocupação com a habitação e desapareceu a referência à dívida externa. Contrariamente, porém, surgiram as drogas com porcentual elevado na lista de apreensões dos brasileiros.

Essa preocupação secundária com o combate à corrupção mostra que os eleitores entregam o voto para candidatos preocupados com a inflação – FHC valeu-se disso para ganhar a eleição montado no Plano Real –, com a saúde, com a educação, a segurança pública e o desemprego. Por fim, porém não menos importante, a distribuição de renda.

O eleitor sabe do que precisa. O moralista que duvidar que atire nele a primeira pedra.

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