sábado, 16 de outubro de 2010

Ana Maria Prestes: "Sonhos"

Reproduzo uma bela mensagem enviada pela amiga Ana Maria Prestes Rabelo:

Pessoas queridas,

Eu não costumo enviar este tipo de email, mas estou tão tocada com estas eleições que não pude me conter.

Certamente o Brasil de Lula e Dilma não é o país dos nossos sonhos, mas o pesadelo que prenuncia a candidatura FHC/Serra é por demais assustador.

Queria citar três experiências pessoais que me levam a dizer isto.

Em 1997, quando eu estudava na Escola Técnica Federal de Goiás, uma escola reconhecida por sua excelência no ensino e na formação tal como as diversas de escolas técnicas federais espalhadas pelo país naquela época, o presidente FHC fez o decreto 2208. O decreto era um golpe à estrutura das escolas técnicas federais por separar o ensino médio do técnico, um dos fatores centrais da qualidade da educação nestes centros.

Para mim foi um momento muito marcante pois eu começava minha militância no movimento estudantil e compartilhei com muitos colegas e professores o drama da implementação do decreto passando por cima de experiências riquissimas de ensino concomitante científico e técnico que formava centenas de jovens capacitados para a sociedade brasileira. O governo obedecia na época uma diretriz do Banco Mundial para a educação de formar mão-de-obra direcionada para as demandas do mercado, restringindo a formação destes jovens e inclusive a empregabilidade futura em outras áreas dada a especificidade da formação.

Com o governo Lula o decreto foi revertido, a maioria das escolas tecnicas foram transformadas em centros de formação tecnológica no nível médio e superior, equipadas e reestruturadas e uma série de novas unidades foram criadas por todo o país. Isso sem falar na geração de emprego que triplicou, dando oportunidade aos que se formavam e nas 14 universidades federais criadas por Lula contra nenhuma criada por FHC dando a chance do prosseguimento nos estudos.

Uma outra experiência pessoal e que tem relação com esta campanha foi a minha estada em 2008 em Portugal, quando realizava uma parte do meu doutorado. Na época acompanhei de perto um rico processo em que um dos países mais católicos do mundo aprovou a Lei da Interrupção Voluntária da Gravidez, ou o aborto. Foi uma campanha linda da sociedade civil com mobilização, debate e exercício democrático da opinião através de referendum que legitimou a lei.

Estou estupefata com o uso político que se tem dado a esta questão nas eleições no Brasil por um casal absolutamente hipócrita, o Sr. Serra e sua esposa, que são a favor do aborto, inclusive por já terem optado pela realização de um, segundo relatos de uma das alunas da esposa do Serra. Esta mesma senhora usou frases chulas contra uma candidata que desde o início falava nas entrevistas que tratava o aborto como uma questão de saúde pública, independente de sua posição pessoal.

Eu pessoalmente sou a favor do aborto e acho que esta campanha oportunista em si já representa um atraso para esta temática no Brasil. Eu quero educar as minhas filhas para um mundo em que elas tenham liberdade para decidir sobre suas convicções religiosas e pessoais e expressá-las livres de constrangimentos morais oportunos e completamente atrasados. Quero para minhas filhas inclusive um país em que a interrupção voluntária de uma gravidez não seja crime, mas um direito da mulher. Mas isto nunca foi assim defendido por Dilma, até porque o programa que ela representa não é da cabeça dela, mas fruto de um conjunto de acúmulos possíveis nas últimas décadas pós redemocratização.

Uma terceira e última experiência que gostaria de relatar - teria outras mais em vários temas - é a do papel do governo Lula no cenário internacional. Principalmente na parte Sul do mundo. Penso que vocês sabem que estou em fase de conclusão da minha tese de doutorado na UFMG em que estudo os movimentos contra-hegemonicos no sul global, especialmente o forum social mundial e sua ocorrencia no Brasil, na Índia e no Quênia.

Devido às minhas atividades internacionais tive a oportunidade de estar nos últimos anos pelos menos 5 vezes na África. Primeiro é impressionante quão profundas e urgentes são as demandas daquele povo em todos os quesitos, desde comida, saneamento e remédios à estruturas políticas mínimas para o exercício da expressão popular e de governos livres do constrangimento pós-colonial. O presidente Lula esteve em absolutamente todos os países da África, em vários foi a primeira vez que um presidente brasileiro e até latino-ameiricano colocava os pés.

Vocês imaginam o Serra indo ao Chad, ao Togo, à Eritrea ou ao Mali? O presidente Lula inverteu o eixo das relações exteriores brasileiras do norte para o sul. Muitas das relações estabelecidas são unilaterais, de apoio brasileiro às demandas dos povos destes países e não necessáriamente atendendo à demandas de comércio exterior brasileiro. Na minha última viagem à Africa do Sul, a ministra de relações exteriores pegou na minha mão e me disse olhando nos olhos: vocês precisam eleger a sucessora de Lula, pela África.

Eu não conheço a Dilma pessoalmente, não posso opinar sobre seu temperamento ou personalidade, mas eu acredito que a política é feita de acúmulos produzidos por coletivos humanos e ela faz parte de um. Ela é a continuidade de um processo ainda precário, mas que representou inúmeros avanços para a população brasileira nos últimos anos.

Eu quero fortemente que minhas filhas vivam em um país que respeite o passado heróico dos que lutaram contra a ditudura, um país livre da homofobia e que respeite o direito dos homossexuais, um país em que o aborto não seja um crime mas um direito de cada mulher à decisão sobre seu corpo e sua vida, um país em que a luta contra a miséria não seja desdenhada mas humanizada, um país em que a liberdade de imprensa não seja usurpada mas democratizada, um país em que boatos, campanhas difamatórias e desonestidade intelectual não sejam a base da candidatura de um concorrente ao mais alto posto do nosso país. Por isso eu voto Dilma.

Ana Maria Prestes Rabelo, estudante do doutorado em ciencia política na UFMG, mãe da Helena (4) e da Gabiela (6 meses).

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2 comentários:

Jose Vianey disse...

Lindo depoimento!
Fiquei emocionado e me perguntando: Por que a maioria das pessoas não enxerga isso?
Parabéns, Ana Maria!

Claudinete Sergipe disse...

A máscara do Serra e da Mônica Serra caiu. O povo está percebendo isto claramente a cada dia. Ele deu um tiro no pé. Dilma, eis a minha sugestão, nomei Lula Ministro da Casa Civil para ele ficar sempre ao seu lado no governo. Assim Lula é Dilma e Dilma é Lula.